quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Como Participei da Enchente de 2011

“Usando de bastante sinceridade, para mim pelo menos, esta enchente teve a vantagm de me proporcionar a realização de horas extras aumentando assim meus rendimentos, em um período em que normalmente eu estaria dormindo, além de que acabei por não perder a apresentação de um trabalho de faculdade, pois nem mesmo aula teve, ficando a apresentação para um outro dia passível de minha presença. Até agora, só foram vantagens para mim a partir do momento em que essa enchente foi anunciada...

O plantão está calmo, estou tranquilo e consegui dormir cerca de duas horas e trinta minutos. Dormi mais do que durmo muitas vezes quando estou em casa. Claro que me compadeço da situação alheia, os desabrigados, mas o que eu posso estar fazendo, de certo modo já estou. Enfrento esta situação com sinceridade.”

Escrevi o que vai aqui em cima durante a enchente de 2008, cuja qual me deixou de plantão no CTI. Realmente, não que eu não tivesse consciência do que estava ocorrendo lá fora, mas queria relatar as coisas a partir do que eu estava vivendo, e não do que sabia que estava acontecendo. Então, um acontecimento catastrófico destes teve para mim consequências meramente positivas. Certamente, outras pessoas também tiraram vantagem da situação e ainda irião tirar, por exemplo, os donos de supermercados aumentando os preços de água e produtos de limpeza. Não agi com maldade, fiz meu serviço na medida do que eu poderia ter feito, não fui um covarde. Não deixei de encarar a situação, mas enquanto Enfermeiro o melhor que eu poderia fazer era realmente estar ali no CTI, cuidando dos pacientes internados, organizando o serviço, atendendo as necessidades dos técnicos em Enfermagem, principalmente de sono, descontração, motivação, para que pudessem continuar prestando seus serviços mesmo diante da pressão das circunstâncias.

Eu tinha plena consciência também de que em breve tudo voltaria ao normal. As pessoas que eu realmente me importava, estavam em segurança, como minha filha por exemplo. Então, não adiantava nada eu agir em desespero, ficar nervoso, preocupado, etc. Depois eu iria raciocinar muito melhor se estivesse de cabeça fria e se não me deixasse convulsionar pela tensão do momento. Destarte, procurei agir, foi a melhor forma que encontrei naquele momento. Cinquenta horas praticamente, ininterruptas, salvo os intervalos para sono e as escapadinhas fora do hospital para fumar, foi o tempo que passei junto com minha equipe, totalmente ilhado. No sábado de manhã, quando as águas haviam baixado, antes de ir embora, ainda montei e organizei uma nova equipe, ligando para a residência dos outros funcionários, questionando se foram ou não atingidos pela enchente e vendo quais poderiam vir para substituir os anteriores que estavam já nitidamente esgotados.

Nessa mesma época da enchente eu passava por um momento difícil em minha vida, e queria mesmo descontar tudo no trabalho. Então estar lá dentro queira ou não era uma válvula de escape. Deste modo, também podemos muitas vezes encontrar positividade em uma guerra, apesar de eu ser contra qualquer tipo de violência, física ou moral, mas não é de se negar que em uma batalha não haja para alguns pontos positivos. É um jogo de ganhar e perder, em certos momentos a gente ganha, em outros a gente perde. Eu ganhei além das horas extras pagas corretamente pelo hospital, experiência, de modo que não temeria nem um pouco ter de ficar de plantão em uma outra enchente, apesar de saber também que uma enchente nunca é igual à outra. Mesmo assim, espero ao menos conservar o mesmo espírito que fez com que eu passasse quase ileso pela primeira. Digo quase, porque algumas conseqüências devo ter sofrido, principalmente no que tange à saúde. Mas, tudo agora já está digamos superado. Fica na memória um momento em que eu me orgulhei de minhas atitudes, de meu posicionamento, e até mesmo da minha escolha de ser Enfermeiro. Tomara que isso conte para o homem lá de cima, se bem que no fundo, ele também poderá dizer que tudo que fiz foi só por vaidade...

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